![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEil3P6FNkg6GvIy_QfNf7QS40mMaFjptpFj4P7HxPyqFjydfsXOeaxExEImXL0SPl7fVU4U06fHMMrGSyChosS3v6Xe1Kh4cSiHCJnE3M0n1l5ANZECCsdQ1ucw6j4h4-jQb4ljQVwbU2Q/s200/Livro_Jose+Luis+Peixoto.jpg)
"Nas suas mãos, a cor da capa estava esbatida pela quantidade de tempo que tinha passado fechado na mala, enquanto olhar para ele a magoava. O peso parecia diferente, a sua realidade era diferente da sua lembrança, da sua cicatriz. Assim, sentiu ainda um tremor antigo quando arrumou o livro na mala, ao lado do pequeno farnel embrulhado num guardanapo de pano, ao lado da carteira, das chaves. E, na madrugada seguinte, levou-o consigo para a biblioteca.
Havia de ganhar coragem.
Ao terceiro dia, respirou e, quando acreditou que ia começar a ler, houve alguma coisa que a distraiu, uma empregada da biblioteca que a chamou para lhe falar de um assunto das casas de banho, os espelhos, e só voltou ao livro, quando já era hora de sair. Estava na mesa onde o tinha deixado e admirou-se, escancarou a boca. O livro estava mexido. Alguém o tinha aberto numa página, número 224, e feito pequenos círculos a lápis, à volta das seguintes palavras: gosto, de, ti. Três palavras distribuídas pela página com círculos à volta. Olhou em redor e, ao longe, entre pessoas distraídas, viu o leitor de livros da biblioteca a fixá-la. Desviou o olhar, guardou o livro na mala e saiu. De repente, estava na rua. Levava pensamentos a ganharem volume, como nuvens."
in "Livro" de José Luís Peixoto
Sem comentários:
Enviar um comentário