18 novembro 2011

Mar


"Já não se lembra? Por acaso nunca mais me saiu do pensamento essa palavra. Foi na Berlenga. Tinhamos saído ao robalo, com um mar que parecia de veludo. De repente vira Norte, as águas começam a subir… Qual barra, nem meia barra?! Toca a andar! Mudámos de rumo, e, depois de muita labuta, lá conseguimos arribar àquelas santas penedias. Que rica ceia! Caldeirada, sardinha assada com pimentos… Dormimos no terraço da Fortaleza, num céu por cima de nós que parecia um crivo. Nunca vi tanta estrela junta na minha vida! Por volta da meia noite  passou ao largo um navio inglês. Uma perfeita cidade a navegar! De madrugada ergui-me, e fui ver os ovos de gaivota. Por aquelas fragas acima… O faroleiro benzia-se! Sítios onde nunca uma criatura humana pôs o pé! Lá em baixo o mar era um vidro a espelhar o Altíssimo…"

in "Mar" de Miguel Torga 

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