06 julho 2009

O Jogo do Anjo

“Dobrei mil esquinas até pensar que me tinha perdido. Por fim, quando tive a certeza de ter já percorrido dez vezes aquele mesmo caminho, dei com a entrada da pequena sala onde me confrontara com o meu próprio reflexo naquele pequeno espelho em que o olhar do homem de preto estava sempre presente. Avistei um espaço vazio entre as lombadas de cabedal preto e, sem pensar, meti lá a pasta do patrão. Preparava-me para abandonar aquele lugar quando me virei , aproximando-me novamente da prateleira. Peguei no volume ao lado do qual tinha colocado o manuscrito e abri-o. Bastou-me ler duas frases para sentir mais uma vez aquele riso obscuro atrás de mim. Devolvi o livro ao seu lugar e peguei noutro ao acaso, folheando-o rapidamente. Peguei noutro, e noutro ainda, e assim sucessivamente até ter examinado dezenas de volumes que povoavam a sala e verificar que todos eles continham diferentes desenhos das mesmas palavras, que os escureciam as mesmas imagens e que a mesma fábula se repetia neles como um pas-de-deux numa infinita galeria de espelhos. Lux Aeterna.”

in "O Jogo do Anjo" de Carlos Ruiz Zafón

Sem comentários:

Enviar um comentário